terça-feira, junho 23


Uma vez eu estava conversando com amigos e a conversa chegou naquele estágio em que só há duas opções: ou ir para casa dormir ou cair na bobagem. Caímos na bobagem. Afinal é para isso que servem os amigos. Depois de nos propormos vários desafios do tipo “quem era que melhor gritava de pavor no cinema?” (a Barbara Stanwyck ganhou fácil), chegamos a uma daquelas questões definitivas e definidoras. Qual é a melhor sensação do mundo? As respostas variaram, desde “banho quente” até “acordar cedo, começar a sair da cama e então lembrar que é feriado”, passando, claro, por outras menos publicáveis. Mas aí um amigo disse duas palavras que liquidaram a questão. – Caderno novo. Todos concordaram. Não foi preciso nem entrar em detalhe, dizer “a sensação de abrir um caderno novo, no primeiro dia de escola, e alisar com a ponta dos dedos a página vazia, sentindo o volume de todas as páginas vazias por trás dela, aquele mundo de coisas ainda não escritas…E o cheiro do caderno!” Não houve um que não concordasse que nenhuma sensação do mundo se igualava àquela. Caderno novo também nos provocava uma certa solenidade, lembra? Diante de sua limpeza, fazíamos um juramento silencioso que aquele ano seríamos alunos perfeitos. E realmente caprichávamos ao preencher o caderno novo com cuidado respeitoso. Pelo menos até a quarta ou quinta página, quando então voltávamos a ser os mesmos relaxados do ano anterior. Mesmo porque aí o caderno não era mais novo.

Luis Fernando Veríssimo

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