sexta-feira, março 21
Para Bernadete
Num mundo de ansiedades insatisfeitas.
Energia da evolução.
Preso como a uma pegajosa cola
Assisto, impotente,
O desfilar de emoções inesperadas.
Sina apaixonante.
Limitado pelo Livre-arbítrio escolho, e sofro,
Os momentos gratos de amizades e amores.
Recompensa suprema.
Sem força ou movimentos vejo, e sinto,
Serem arrancadas partes de meu corpo celeste.
Experiência dolorosa.
Escravo de meu corpo
Preso como a uma pegajosa cola
Limitado pelo Livre-arbítrio
Sem força ou movimentos
Posso optar,
Posso chorar.
Energia da evolução.
Sina apaixonante.
Recompensa suprema.
Experiência dolorosa.
Posso chorar.
(Amilcar Brunazo Filho- o Kika)
Bom Dia!!!!Bjocas!!!!Graciela
Toma o amor guardado entre as conchas da minha mão.
Dentro delas ouvi as ondas quebrando-se em pedras e o espetáculo de um pequeno musgo nascido à beira de um raio de sol.
Dentro delas, ouvi a terra aninhando sementes e plantas entrelaçando a ponta de suas raízes.
Finas raízes tentando sustentar o mundo sob as placas de cimento.
As placas de cimento, de onde germinam as casas e crescem as pessoas, entrelaçando a ponta de seus braços e o mais fundo de seus corpos pela noite escura.
Dentro delas, ouvi o mundo inteiro tentando ser par... e ouvi a ponta de tuas asas tocando minhas costas nuas, teu instrumento de cordas e suspiros profundos.
Rita Apoena
Páscoa
A Primavera,uma assunção de flores.
A vida Renascida
E celebrada
Num festival de pétalas e cores.
Miguel Torga, diário XIV
As ensinanças da dúvida
quarta-feira, março 19
Te envio o mar
O mar rumoroso que trago em mim, um mar de sal e conchas que talham os pés, um mar de areias, poeira, moluscos enterrados. Te envio o mar que trago nas mãos e desfio pérolas em contas de lágrima, alívio, vento no rosto, maresia e iodo, coral. Te envio o mar que trago nos olhos, ardidos, cheios de terra, ondas e espuma, um mar que pode estar perto de ti, ainda que estejas longe dele. Te envio o mar que trago na boca, salitre, sol, palavras fugidias que não escutarias com a rebentação. Te envio o mar que faço em mim.
- Patrícia Antoniete -
Pudesse Eu
Ando um pouco acima do chão
Ando um pouco acima do chão
Nesse lugar onde costumam ser atingidos
Os pássaros
Um pouco acima dos pássaros
No lugar onde costumam inclinar-se
Para o voo
Tenho medo do peso morto
Porque é um ninho desfeito
Estou ligeiramente acima do que morre
Nessa encosta onde a palavra é como pão
Um pouco acima da palma da mão que divide
E não separo como o silêncio em meio do que escrevo
Ando ligeiro acima do que digo
E verto sangue para dentro das palavras
Ando um pouco acima da transfusão do poema
Ando humildemente nos arredores do verbo
Passageiro num degrau invisível sobre a terra
Nesse lugar das árvores com fruto e das árvores
No meio de incêndios
Estou um pouco no interior do que arde
Apagando-se devagar e tendo sede
Porque ando acima da força a saciar quem vive
E esmago o coração para o que desce sobre mim
E bebe
Daniel Faria
Algumas Reflexões Sobre a Mulher
Elas são as mães:
rompem do inferno, furam a treva,
arrastando
os seus mantos na poeira das estrelas.
Animais sonâmbulos,
dormem nos rios, na raiz do pão.
Na vulva sombria
é onde fazem o lume:
ali têm casa.
Em segredo, escondem
o latir lancinante dos seus cães.
Nos olhos, o relâmpago
negro do frio.
Longamente bebem
o silencio
nas próprias mãos.
O olhar
desafia as aves:
o seu voo é mais fundo.
Sobre si se debruçam
a escutar
os passos do crepúsculo.
Despem-se ao espelho
para entrarem
nas águas da sombra.
É quando dançam que todos os caminhos
levam ao mar.
São elas que fabricam o mel,
o aroma do luar,
o branco da rosa.
Quando o galo canta
Desprendem-se
para serem orvalho.
Eugénio de Andrade
Poema Antigo
O homem que percorro
com as mãos
e a lua que concebo
na altitude
do tédio
Só
o oceano
penso paralelo — ventre
à praia intata
das janelas brancas
com silêncio
ciclamens-astros
entre
as vozes que calaram
para sempre
o verbo — bússola
com raiz — grito de relevo
O homem que percorro
com as mãos
a estátua que consinto
a lua que concebo.
Maria Teresa Horta
A Árvore
Era uma vez – em tempos muito antigos, no arquipélago do Japão – uma árvore enorme que crescia numa ilha muito pequenina.Os japoneses têm um grande amor e um grande respeito pela Natureza e tratam todas as árvores, flores, arbustos e musgos com o maior cuidado e com um constante carinho.
Assim, o povo dessa ilha sentia-se feliz e orgulhoso por possuir uma árvore tão grande e tão bela: é que em nenhuma outra ilha do Japão, nem nas maiores, existia outra árvore igual. Até os viajantes que por ali passavam diziam que mesmo na Coreia e na China nunca tinham visto uma árvore tão alta, com a copa tão frondosa e bem formada.E, nas tardes de Verão, as pessoas vinham sentar-se debaixo da larga sombra e admiravam a grossura rugosa e bela do tronco, maravilhavam-se com a leve frescura da sombra, o suspirar da brisa entre as folhagens perfumadas.
Assim foi durante várias gerações.Mas, com o passar do tempo, surgiu um problema terrível, e por mais que todos meditassem e discutissem, ninguém era capaz de arranjar uma boa solução.Porque, ao longo dos anos, a árvore tinha crescido tanto, os seus ramos tinham-se tornado tão compridos, a sua folhagem tão espessa e a sua copa tão larga que, durante o dia, metade da ilha ficava sempre à sombra.
De maneira que metade das casas, das ruas, das hortas e dos jardins nunca apanhava sol.E, na metade ensombrada, as casas estavam a ficar húmidas, as ruas tinham-se tornado tristes, as hortas já não davam legumes, os jardins já não davam flor. E a gente que ali morava andava sempre pálida e constipada.E, à medida que a sombra da árvore crescia, crescia também a perturbação.As pessoas gemiam:— Que havemos de fazer? Que havemos de fazer?
Até que foi decidido a população reunir-se toda em conselho para examinar bem o problema e decidir o remédio que devia dar-lhe.Discutiram durante muitos dias e, depois de todos terem falado, chegou-se à triste conclusão de que era preciso cortar a árvore.
Houve choros, lamentações, gemidos.A árvore era bela, antiga e venerável. Fazê-la desaparecer era um acto que não só entristecia os habitantes da ilha mas que também os assustava.Mas não havia outro remédio e quase todos acabaram por concordar com o corte.No lugar onde antes ela se erguia, plantaram um pequeno bosque de cerejeiras, pois as cerejeiras nunca crescem muito.* * *Abater a árvore foi difícil e toda a gente teve de ajudar.
Mas, depois de cortada, ela ocupava tanto espaço que a ilha ficou quase sem lugar para mais nada. Por isso começaram a desfazê-la: primeiro cortaram os ramos e as pernadas e a sua madeira foi distribuída entre todos, para que cada um pudesse fabricar alguma coisa que lhe lembrasse a árvore tão amada.Alguns fabricaram pequenas mesas, outros, varandas para as suas casas, outros, caixilhos para os biombos, outros, caixas, tabuleiros, tigelas, colheres, pentes e ganchos para as mulheres espetarem no cabelo.No fim ficou só o enorme e grosso tronco nu, deitado aEntão começaram a chegar viajantes e armadores que queriam aquela óptima madeira para fabricar barcos.Mas a população não quis. Reuniram todos outra vez em conselho e decretaram:— Os habitantes desta ilha não querem separar-se da sua árvore que, antes de crescer demais, lhes deu tanta alegria. Vamos nós próprios construir o nosso barco.E assim foi. Depois da chuva do Outono, deixaram o tronco secar durante longos meses e, logo que viram que a madeira já estava bem seca, meteram mãos à obra.
E, como são um povo muito inteligente, os japoneses, que trabalham muito bem, muito depressa, com muito esmero e são óptimos carpinteiros, construíram rapidamente uma grande e linda barca toda esculpida e pintada de muitas cores.Então houve uma grande festa e a barca foi lançada ao mar.À noite houve fogo de vista e em todas as ruas e praças se acenderam balões de papel, azuis, amarelos e vermelhos
* * *Assim, durante muitos anos, a vida naquela ilha correu com muita alegria e animação.
Mas apesar dessa alegria, apesar dos bons negócios e dos grandes passeios, todos se lembravam com saudade da velha árvore.— Como era alta e bela! — diziam.— Como a sua sombra era perfumada!— Como era doce e leve o sussurrar da brisa nas suas folhas!— Como a sua copa era redonda e bem formada!— Como as suas folhas eram verdes e bem desenhadas!— Como era tão suave a frescura debaixo dos seus ramos, nas manhãs de Verão!E, assim, entre palavras e pensamentos, a árvore nunca era esquecida.
E os anos foram passando.Até que os marinheiros e os calafates descobriram que estava a acontecer uma grande desgraça:A madeira da quilha da grande barca tinha começado a apodrecer.— Ai de nós! — choravam os habitantes. — Não vamos dar mais passeios pelo mar. Nas noites de lua cheia, não vamos visitar mais as outras ilhas, não vamos fazer mais negócios.
Mas os comerciantes sossegaram-nos.— Durante estes anos — disseram eles — graças à nossa grande barca, andámos a navegar de ilha em ilha, de porto em porto, a comprar e a vender, e fizemos negócios tão bons que juntamos muito dinheiro.
Por isso, como aqui não há outra árvore enorme, e as árvores que agora temos fazem muita falta se forem cortadas, estamos dispostos a ir às outras ilhas comprar boa madeira. E todos juntos podemos construir outra grande barca.A população aplaudiu o discurso e concordou com o projecto e daí a poucos meses a barca nova ficou pronta e logo a puseram a flutuar.Então, a barca velha foi arrastada para a praia. O povo cercou-a em silêncio com grande tristeza, e os carpinteiros e os calafates examinaram-na tábua por tábua.A madeira do casco, do convés e dos bancos estava quase toda semi-apodrecida e só servia para queimar. Mas o mastro grande, que tinha sido tirado do cerne da velha árvore, continuava são e bem conservado.— Temos que fazer com este mastro alguma coisa que nos lembre a nossa árvore antiga e a nossa barca — disse o chefe da ilha.
Depois de muito pensar resolveram fazer uma biwa, que é uma espécie de guitarra japonesa.Quando a obra ficou pronta, a população reuniu-se na praça principal e sentaram-se em silêncio em redor do melhor músico da ilha para ouvirem o som da biwa.Mas, mal os dedos do músico fizeram soar as cordas, de dentro da biwa ergueu-se uma voz que cantou:A árvore antigaQue cantou na brisaTornou-se cantigaEntão, todos compreenderam que a memória da árvore nunca mais se perderia, nunca mais deixaria de os proteger, porque os poemas passam de geração em geração e são fiéis ao seu povo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Assim, o povo dessa ilha sentia-se feliz e orgulhoso por possuir uma árvore tão grande e tão bela: é que em nenhuma outra ilha do Japão, nem nas maiores, existia outra árvore igual. Até os viajantes que por ali passavam diziam que mesmo na Coreia e na China nunca tinham visto uma árvore tão alta, com a copa tão frondosa e bem formada.E, nas tardes de Verão, as pessoas vinham sentar-se debaixo da larga sombra e admiravam a grossura rugosa e bela do tronco, maravilhavam-se com a leve frescura da sombra, o suspirar da brisa entre as folhagens perfumadas.
Assim foi durante várias gerações.Mas, com o passar do tempo, surgiu um problema terrível, e por mais que todos meditassem e discutissem, ninguém era capaz de arranjar uma boa solução.Porque, ao longo dos anos, a árvore tinha crescido tanto, os seus ramos tinham-se tornado tão compridos, a sua folhagem tão espessa e a sua copa tão larga que, durante o dia, metade da ilha ficava sempre à sombra.
De maneira que metade das casas, das ruas, das hortas e dos jardins nunca apanhava sol.E, na metade ensombrada, as casas estavam a ficar húmidas, as ruas tinham-se tornado tristes, as hortas já não davam legumes, os jardins já não davam flor. E a gente que ali morava andava sempre pálida e constipada.E, à medida que a sombra da árvore crescia, crescia também a perturbação.As pessoas gemiam:— Que havemos de fazer? Que havemos de fazer?
Até que foi decidido a população reunir-se toda em conselho para examinar bem o problema e decidir o remédio que devia dar-lhe.Discutiram durante muitos dias e, depois de todos terem falado, chegou-se à triste conclusão de que era preciso cortar a árvore.
Houve choros, lamentações, gemidos.A árvore era bela, antiga e venerável. Fazê-la desaparecer era um acto que não só entristecia os habitantes da ilha mas que também os assustava.Mas não havia outro remédio e quase todos acabaram por concordar com o corte.No lugar onde antes ela se erguia, plantaram um pequeno bosque de cerejeiras, pois as cerejeiras nunca crescem muito.* * *Abater a árvore foi difícil e toda a gente teve de ajudar.
Mas, depois de cortada, ela ocupava tanto espaço que a ilha ficou quase sem lugar para mais nada. Por isso começaram a desfazê-la: primeiro cortaram os ramos e as pernadas e a sua madeira foi distribuída entre todos, para que cada um pudesse fabricar alguma coisa que lhe lembrasse a árvore tão amada.Alguns fabricaram pequenas mesas, outros, varandas para as suas casas, outros, caixilhos para os biombos, outros, caixas, tabuleiros, tigelas, colheres, pentes e ganchos para as mulheres espetarem no cabelo.No fim ficou só o enorme e grosso tronco nu, deitado aEntão começaram a chegar viajantes e armadores que queriam aquela óptima madeira para fabricar barcos.Mas a população não quis. Reuniram todos outra vez em conselho e decretaram:— Os habitantes desta ilha não querem separar-se da sua árvore que, antes de crescer demais, lhes deu tanta alegria. Vamos nós próprios construir o nosso barco.E assim foi. Depois da chuva do Outono, deixaram o tronco secar durante longos meses e, logo que viram que a madeira já estava bem seca, meteram mãos à obra.
E, como são um povo muito inteligente, os japoneses, que trabalham muito bem, muito depressa, com muito esmero e são óptimos carpinteiros, construíram rapidamente uma grande e linda barca toda esculpida e pintada de muitas cores.Então houve uma grande festa e a barca foi lançada ao mar.À noite houve fogo de vista e em todas as ruas e praças se acenderam balões de papel, azuis, amarelos e vermelhos
* * *Assim, durante muitos anos, a vida naquela ilha correu com muita alegria e animação.
Mas apesar dessa alegria, apesar dos bons negócios e dos grandes passeios, todos se lembravam com saudade da velha árvore.— Como era alta e bela! — diziam.— Como a sua sombra era perfumada!— Como era doce e leve o sussurrar da brisa nas suas folhas!— Como a sua copa era redonda e bem formada!— Como as suas folhas eram verdes e bem desenhadas!— Como era tão suave a frescura debaixo dos seus ramos, nas manhãs de Verão!E, assim, entre palavras e pensamentos, a árvore nunca era esquecida.
E os anos foram passando.Até que os marinheiros e os calafates descobriram que estava a acontecer uma grande desgraça:A madeira da quilha da grande barca tinha começado a apodrecer.— Ai de nós! — choravam os habitantes. — Não vamos dar mais passeios pelo mar. Nas noites de lua cheia, não vamos visitar mais as outras ilhas, não vamos fazer mais negócios.
Mas os comerciantes sossegaram-nos.— Durante estes anos — disseram eles — graças à nossa grande barca, andámos a navegar de ilha em ilha, de porto em porto, a comprar e a vender, e fizemos negócios tão bons que juntamos muito dinheiro.
Por isso, como aqui não há outra árvore enorme, e as árvores que agora temos fazem muita falta se forem cortadas, estamos dispostos a ir às outras ilhas comprar boa madeira. E todos juntos podemos construir outra grande barca.A população aplaudiu o discurso e concordou com o projecto e daí a poucos meses a barca nova ficou pronta e logo a puseram a flutuar.Então, a barca velha foi arrastada para a praia. O povo cercou-a em silêncio com grande tristeza, e os carpinteiros e os calafates examinaram-na tábua por tábua.A madeira do casco, do convés e dos bancos estava quase toda semi-apodrecida e só servia para queimar. Mas o mastro grande, que tinha sido tirado do cerne da velha árvore, continuava são e bem conservado.— Temos que fazer com este mastro alguma coisa que nos lembre a nossa árvore antiga e a nossa barca — disse o chefe da ilha.
Depois de muito pensar resolveram fazer uma biwa, que é uma espécie de guitarra japonesa.Quando a obra ficou pronta, a população reuniu-se na praça principal e sentaram-se em silêncio em redor do melhor músico da ilha para ouvirem o som da biwa.Mas, mal os dedos do músico fizeram soar as cordas, de dentro da biwa ergueu-se uma voz que cantou:A árvore antigaQue cantou na brisaTornou-se cantigaEntão, todos compreenderam que a memória da árvore nunca mais se perderia, nunca mais deixaria de os proteger, porque os poemas passam de geração em geração e são fiéis ao seu povo.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Epigrama
Abro-te a porta do poema; e tu
espreitas para dentro da estrofe, onde
um espelho te espera.
Nuno Júdice
Blocos
É isto vivemos dentro
de grandes blocos de gelo
sem aquecermos ao menos
com os dedos outros dedos
No fundo de nós temendo
que um dia se quebre o gelo
David Mourão-Ferreira
Recado
ouve-me
que o dia te seja limpo
e a cada esquina de luz possas recolher
alimento suficiente para a tua morte
vai até onde ninguém te possa falar
ou reconhecer - vai por esse campo
de crateras extintas - vai por essa porta
de água tão vasta quanto a noite
deixa a árvore das cassiopeias cobrir-te
e as loucas aveias que o ácido enferrujou
erguerem-se na vertigem do voo - deixa
que o outono traga os pássaros e as abelhas
para pernoitarem na doçurado teu breve coração - ouve-me
que o dia te seja limpo
e para lá da pele constrói o arco de sal
a morada eterna - o mar por onde fugirá
o etéreo visitante desta noite
Al Berto
Manhã
Certas manhãs trazem uma luz diferente.
Um ar de primavera,
um pássaro que entrou
por uma fresta do telhado, e anda às
voltas na escada, uma voz que se ouve, num eco,
e não se sabe o que diz.
A manhã irá passar,
como todas as manhãs que nasceram,
trazendo uma luz diferente;
mas a primavera que ela anuncia colou-se ao rosto
com quem nos cruzamos;
o canto do pássaro meteu-se na cabeça,
como se ele voasse por dentro da memória;
e o eco que ouvi ganhou uma voz na tua boca,
quando te encontrei e me disseste que havia uma luz diferente,
nesta manhã em que tudo parecia igual.
Nuno Júdice
AO FIM
Ao Fim são muito poucas as palavras
que nos doem a sério e muito poucas
as que conseguem alegrar a alma.
São também muito poucas as pessoas
que tocam nosso coração e menos
ainda as que o tocam por muito tempo.
E ao fim são pouquíssimas as coisas
que em nossa vida a sério nos importam:
poder amar alguém, sermos amados
e não morrer depois dos nossos filhos.
Poema de Amalia Bautista
que nos doem a sério e muito poucas
as que conseguem alegrar a alma.
São também muito poucas as pessoas
que tocam nosso coração e menos
ainda as que o tocam por muito tempo.
E ao fim são pouquíssimas as coisas
que em nossa vida a sério nos importam:
poder amar alguém, sermos amados
e não morrer depois dos nossos filhos.
Poema de Amalia Bautista
AMIZADE
Do teu sereno olhar, do teu sorriso,
Da tua mão pousada no meu ombro.
Ouvir-te murmurar: -- "Espera e confia!"
E sentir-se converter em harmonia,
O que era, dantes, confusão e assombro.
Poema de Carlos Queirós
terça-feira, março 18
Quando eu nasci,
ficou tudo como estava,
Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.
Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.
As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...
P'ra que o dia fosse enorme,
bastava toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...
José Régio
Palavra feia
No fundo nem sei se sou fruto, se sou pecado, se sou santa do mal encapuzado.
Não tenho gosto de maracujá, mas tenho cheiro no corpo todo, nos cabelos, no andar.
Sou açaí, sou pitanga amarga, sou manga doce, sou tudo "como se fosse" e no fundo nem o que ousas imaginar...
Sou mais do sentir, sou mais do tocar...
Sou como a palavra dificil e feia, mas que tem um significado bonito e que só o nome é esquisito de se falar.
Não sei do que me visto para ti, se de verso ou se de rima, se de fruta ou fantasia; mas no fundo ser o que sou (e desconheço) me fascina, porque posso provar o gosto selvagem da vida em sua seiva que em mim germina.
(Cáh Morandi)
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